Eu nunca vi um filme tão feminista, sem ser feminista.
Desde que estreou nos cinemas, Pobres Criaturas tem sido alvo de elogios, críticas, reflexões. O filme tem tantas camadas e mexe em questões tão complexas e profundas que cada um que escreve ou fala sobre o filme pode abordar um aspecto diferente a partir da sua leitura, suas experiências. Assisti ao filme duas vezes no cinema. Saí tão impactada a primeira vez que precisei voltar na semana seguinte. E voltaria outras tantas vezes se fosse possível. Hoje, quero escrever não só sobre o filme, há muitas resenhas por aí falando sobre a linguagem, as questões abordadas pelo filme, a estética surrealista, o trabalho da Emma Stone, etc. Quero falar sobre como o filme tem impactado as pessoas. O que tem me chamado a atenção ao observar tudo isso é ver tantas pessoas incomodadas com esse filme. A maioria das pessoas que não gostou do filme critica o "exagero das cenas de sexo". Lembro-me do casal que saiu na minha frente da sala de cinema conversando sobre como acharam o filme muito pornográfico. Isso me marcou tanto quanto o próprio filme. Aliás, foi parte da minha experiência com o filme, ilustrando exatamente a “sociedade polida” que acabava de ser dilacerada na sala de cinema. A própria Emma parece que já declarou que não aguenta mais responder sobre se foi ou não difícil fazer as cenas de sexo, com tanta coisa para dizer sobre a personagem. O que eu penso sobre isso é que é, exatamente por isso, que o filme ainda é tão necessário. Uma história incrível é criada para mostrar o sexo como parte da nossa natureza. Uma mente inocente e livre, ainda não moldada pela educação de uma sociedade que demoniza o sexo, ganha uma forma de existir em um corpo de mulher e pode descobrir e desfrutar do sexo de uma forma que a nossa educação não permite. Ou seja, o filme existe justamente para falar sobre isso, para desdemonizar o sexo, entre outras tantas coisas. Um filme lindo, que ultrapassa todas as camadas superficiais para nos mostrar outras realidades possíveis. Inclusive uma em que o macho canalha é ridículo e a mulher livre é a heroína, não porque tem superpoderes ou porque conquistou poderes, mas porque não limaram os seus poderes naturais. E tem gente dizendo que o filme não pode ser considerado feminista porque foi dirigido por um homem, ou sei lá mais o que. Eu nunca vi um filme tão feminista, sem ser feminista. A revolução pela arte. Tão forte, tão delicado. Um filme que não me amedronta enquanto mulher, mas me enche o peito de coragem e beleza. Não foi de propósito que escrevi esse texto às vésperas do dia da mulher. Mas, já que estamos aqui, tudo que ainda posso dizer é: obrigada, Bella Baxter, por existir.
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Sobre a autora
Luiza Pessôa é bailarina, coreógrafa, graduada em História e pós-graduada em História da Arte. É autora e coordenadora editorial do blog Ao Redor Cultura e Arte.
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