As origens do ballet
A atual literatura identifica a origem do ballet na Itália, no período renascentista, com tradições de dança dos bailes de corte. Tradição que nasceu como uma forma dos nobres anfitriões receberem e entreterem seus convidados nas grandes festas da corte. Eram encenações completas que uniam dança, música, interpretação e poesia.
Apesar dessas raízes na Itália, é natural que se pense na França como o berço do ballet. Isso porque, depois de introduzida na França, é que esta arte se desenvolveu de forma ampla e sistematizada e foi adquirindo aos poucos o formato mais próximo ao que reconhecemos hoje como ballet. Tal fator causou a influência do francês na nomenclatura da metodologia do ballet.
Essa tradição das danças de corte foi introduzida na França pela princesa Catarina de Médici, ao casar-se com o rei da França, Henrique II. Catarina de Médici foi uma grande incentivadora da dança na França, mandando buscar da Itália os melhores dançarinos. A partir desse momento essas danças começam a se descolar dos bailes para dar origem ao primeiro gênero de ballet, os ballets de corte e ganhar uma nova função, uma função cênica. O primeiro grande ballet teatral de que se tem registro na França foi o “Balé Comique de la Reine”, de Baltasar Beaujoyeux, que em 1581 marcou a história do ballet numa apresentação de seis horas para um público de aproximadamente dez mil pessoas.
O período de consolidação
O segundo período de grande importância para o desenvolvimento do ballet foi o reinado de Luís XIV. O monarca proporcionou a Paris um intenso alargamento cultural e artístico através da fundação de diversas academias de artes que alavancaram a pintura, a música a escultura, a literatura e a dança. Os espetáculos da época eram extremamente luxuosos e duravam muitas horas, às vezes vários dias. Luís XIV foi um grande incentivador da dança durante todo o seu reinado.
O monarca foi uma das figuras mais representativas do absolutismo francês. E o patrocínio das artes fazia parte do projeto de enaltecimento e reafirmação do absolutismo. A criação das academias não era, naturalmente, apenas por apreço à arte, mas uma forma de controle da produção artística também. O próprio Luís XIV dançou durante muitos anos como bailarino principal em vários de seus ballets. O mais famoso deles, o ballet “Le Nuit”, tornou-o conhecido como “Rei Sol”, devido ao papel de astro-rei que representava na peça. O que é bastante ilustrativo desse projeto de utilização da arte para o enaltecimento do poder absoluto do Rei.
Luís XIV criou em 1661 a Academia Real de Dança, que proporcionou o estudo metodológico e profissional do ballet. Charles-Louis-Pierre de Beauchamps foi o primeiro grande maître de ballet. Mestre e segundo diretor da Academia Real de Dança e o próprio professor de Luís XIV. Beauchamps foi o criador das cinco posições dos pés básicas do ballet. A quarta posição cruzada foi criada posteriormente. O uso dessas posições tinha finalidade estética, além de contribuir para a manutenção do equilíbrio do corpo. Beauchamps não deixou nada publicado, mas há registros de sistemas de dança com desenhos, descrição de passos e eixos de movimento deixados por alguns de seus discípulos.
O “en dehors” (que significa “para fora”) tinha a função de não deixar o bailarino de costas para o público, o que ocorreu quando os ballets teatrais foram levados aos palcos e o público passou a assistir à apresentação de frente. Isso ocasionou importantes mudanças na movimentação e na estruturação dos movimentos. Destaque-se, entretanto, que a movimentação dos ballets teatrais inicialmente era suave, mais rasteira e tinha os homens nos papéis principais. O “en dehors” não buscava ainda os 180º, pois predominavam a elegância e o requinte da movimentação e não as conquistas físicas ou acrobáticas. Ao contrário, o que era acrobático estava muito mais relacionado às artes populares do que nobres.
Segundo a pesquisadora Caroline K. Castro, “o ballet que marcou definitivamente a despedida dos amadores de cena, e muito mais, que instaurou o início da participação feminina nos papéis principais, só iria ocorrer em 1681, com a produção de Le Triomphe de l’Amour.” (CASTRO, Caroline Konzen, 2015) ¹. Tal ballet contou com a participação de Mademoiselle de La Fontaine, considerada a primeira bailarina profissional.
Transformações e influÊncias: o virtuosismo e o ballet romântico
A dança clássica virtuosa surgiu apenas no iluminismo. Jean-Georges Noverre revolucionou o ballet através de novas propostas. Foi Noverre quem aboliu as máscaras, justificando que escondiam a expressão real do bailarino, que ele valorizava muito. Noverre aboliu também as grandes perucas dos ballets e se preocupou com a formação completa dos bailarinos.
No século XVIII, influenciado pelo movimento romântico, o ballet incorporou as temáticas típicas desse movimento artístico, como a presença de um feminino idealizado, temáticas mágicas ou mitológicas. Esses temas acabaram reverberando na própria movimentação do ballet romântico que pretendia “negar a gravidade”, buscando graciosidade e leveza, o que ensejou o surgimento das primeiras sapatilhas de ponta. Marie Taglioni foi a primeira bailarina a utilizar uma dessas.
A partir do século XIX, o balé foi aperfeiçoado e cada vez mais disseminado e consolidado na França, na Itália, na Rússia, na Dinamarca e na Inglaterra. Posteriormente, ganhou o mundo e estabeleceu sólidas escolas, cada qual com suas particularidades, mas mantendo sua estrutura, também nos EUA, Cuba, Alemanha, China, e outros países.
Notas:
¹ - CASTRO, Caroline Konzen. Métodos do balé clássico: história e consolidação. CRV, 2015.
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A autora: Luiza Pessôa é bailarina, coreógrafa e graduada em História com pesquisas na área de história da dança e dança e educação. Visite o canal do YouTube.