A arte como transformação
- Luiza PessƓa
- 15 de dez. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 20 de jan. de 2024

A abordagem de NƩstor Garcia Canclini sobre o potencial transformador da arte.
Este artigo fundamenta-se em um autor especĆfico, que atravĆ©s de muitos questionamentos nos apresenta uma visĆ£o sobre a arte que enfatiza seu potencial transformador.
A arte enquanto representação de uma realidade pode encobrir ou expor as contradições sociais. Quando as expõe, colabora para a transformação.
NĆ©stor Garcia Canclini, antropólogo argentino contemporĆ¢neo, dedica-se a investigar, principalmente, a pós-modernidade e Ć© uma referĆŖncia quando o assunto Ć© cultura latino-americana. Em seu texto āA Socialização da Arteā, Canclini debruƧa-se sobre a forma e a função dos objetos para responder o que define uma obra de arte. No texto, demonstra que a maioria dos teóricos da estĆ©tica considerou que a experiĆŖncia artĆstica ocorre quando prevalece a forma sobre a função de um objeto. Mas como identificar o que produz esse predomĆnio da forma sobre a função? SerĆ” que Ć© algo contido no próprio objeto ou definido por uma intenção do observador?
Segundo o autor, os dois elementos, observador e objeto, sĆ£o determinantes. No entanto, ambos, objeto e sujeito observador, sĆ£o determinados de acordo com cada cultura, modo de produção, perĆodo, convenƧƵes variĆ”veis e que modificam o sentido de utilidade e de estĆ©tica dos objetos. A caracterĆstica de āartĆsticoā nĆ£o Ć©, portanto, essencial e nĆ£o estĆ” apenas no objeto ou no observador, mas na relação do homem com o objeto e em determinado contexto histórico-cultural. Assim, o autor justifica que a āestĆ©tica deve partir da anĆ”lise crĆtica das condiƧƵes sociais em que produz o artĆsticoā. Sugerindo, entĆ£o, que a tradição de estudos da estĆ©tica deve ser substituĆda por uma nova visĆ£o orientada pelas ciĆŖncias sociais e da comunicação.
A partir dessa abordagem, o autor reconhece e procura explicar as dificuldades da existĆŖncia de uma sociologia da arte. Dificuldades que sĆ£o consequĆŖncia, principalmente, da complexidade do fenĆ“meno artĆstico e das limitaƧƵes das ciĆŖncias sociais para tratar o assunto. Dentro dessas limitaƧƵes encontra-se certa insuficiĆŖncia metodológica, especialmente por aplicarem-se princĆpios positivistas e pelas barreiras da linguagem para auxiliar nas definiƧƵes referentes Ć s questƵes da arte.
Ć certo que se desenvolveu ao longo do tempo uma preocupação por parte dos teóricos, historiadores, sociólogos em relacionar a arte com o contexto de sua criação. Alguns desses teóricos foram Hippolyte taine, Erwin Panofsky e Pierre Francastel. Para Canclini, esses pensadores trouxeram importantes contribuiƧƵes para o desenvolvimento da sociologia da arte, pois ampliaram a visĆ£o do entrelaƧamento entre a arte e o contexto social em que estĆ” inserida. No entanto, o autor critica os pesquisadores citados alegando terem descuidado de importantes aspectos desse entrelaƧamento. Assim, afirma que em Taine falta melhor definição sobre que fatores do āmeioā sĆ£o determinantes no fenĆ“meno artĆstico e acusa Francastel de descuidar das determinaƧƵes sócio-econĆ“micas. Canclini afirma ainda que a produção de trabalhos que relacionam a arte ao contexto de uma maneira satisfatória Ć© uma produção muito recente e escassa. Dentro dessa tendĆŖncia, o autor destaca o marxismo como principal fonte teórica que contribui para o embasamento dessas pesquisas.
Segundo a teoria marxista, as alteraƧƵes nas condiƧƵes econĆ“micas de produção determinam o desenvolvimento de todos os setores da superestrutura e, portanto, nĆ£o seria diferente com a arte. A partir da anĆ”lise marxista, Canclini afirma que āno sistema capitalista, as obras de arte, como todos os bens, sĆ£o mercadoriasā. Ou seja, existe o propósito de obter lucro. Canclini aponta o exemplo prĆ”tico de como os artistas tĆŖm suas produƧƵes determinadas pelas exigĆŖncias do mercado e trata tambĆ©m dos vĆnculos entre a arte e a realidade e de como a obra de arte pode ir alĆ©m da representação para ser elemento de transformação. Para isso, o autor diferencia os artistas que produzem servindo Ć lógica da reprodução das relaƧƵes sociais a favor das classes dominantes, daqueles artistas que produzem com o sentido de transformação e libertação. A arte enquanto representação de uma realidade pode encobrir ou expor as contradiƧƵes sociais. Quando as expƵe, colabora para a transformação.
Canclini volta-se para a realidade da produção artĆstica latino-americana, sua especialidade, e conclui que o processo decisivo na problemĆ”tica atual da arte Ć© que o controle da produção, distribuição e consumo sejam assumidos pelos povos. Isso permitiria o aumento de uma produção artĆstica que nĆ£o apenas represente a realidade, mas o faƧa de forma crĆtica e possa ser transformadora da realidade. Ć interessante, no entanto, observar neste autor como ele trata o carĆ”ter de ādivertimentoā presente na arte - mesmo ao abordar temas graves - como colaborador nessa proposta transformadora. Segundo o autor, essa Ć© uma importante faceta da arte para que o entretenimento nĆ£o fique restrito aos meios de comunicação de massa. Socializar a arte, segundo Canclini, envolve tambĆ©m o prazer e a redistribuição do acesso a esse prazer e a criação.
ReferĆŖncia
āA Socialização da Arteā, GARCIA Nestor, Ed. Cultrix, SP.
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Da pré-história à arte contemporânea.